Conta a lenda que Oxalá, numa de suas caminhadas pelo mundo, iria passar pela aldeia de Oxum, onde pretendia parar e descansar.
Exú,
mensageiro dos orixás, correu para avisar Oxum que o grande orixá
fun-fun estava a caminho de sua cidade. Era preciso organizar uma grande
recepção, pois a visita era muito importante para todos. Ela, então,
apressou-se com os preparativos da festa, ordenando a limpeza de todas
as casas e lugares públicos da aldeia, bem como que os enfeites
utilizados fossem da cor branca. Oxum cuidou pessoalmente da
ornamentação e limpeza de seu palácio, pois tudo tinha que estar
perfeito, à altura de Oxalá.
Com tantos afazeres importantes, em tão curto espaço de tempo, Oxun não se lembrou de convidar as Iya-mi para a grande festa.
As
feiticeiras não perdoaram essa desfeita. Sentindo-se muito
desprestigiadas, resolveram desmoralizar Oxum perante os convidados.
No
dia da chegada de Oxalá à cidade, Oxorongá entrou disfarçada no palácio
para colocar, no assento do trono da Oxum, um preparado mágico, que não
fora notado por ninguém.
Toda a cidade estava impecavelmente limpa e
ornamentada. O palácio de Oxum, que fora caprichosamente preparado,
tinha seus móveis e utensílios cobertos por tecidos de uma alvura
imaculada. Branca também seria a cor das roupas utilizadas na cerimônia.
Oxalá
finalmente chegou, sendo respeitosamente reverenciado numa grande
demonstração de fé e admiração ao grande mensageiro da paz.
Oxun,
sentada em seu trono, esperava com impaciência a entrada de Oxalá em seu
palácio, quando iria oferecer-lhe seu próprio assento. Mas, ao tentar
levantar-se, percebeu que estava presa em sua cadeira e, por mais força
que fizesse, não conseguia soltar-se. O esforço que empreendeu foi tão
grande, que, mesmo ferida, conseguiu ficar em pé, mas uma poça de sangue
havia manchado suas roupas e também sua cadeira.
Quando Oxalá viu
aquele sangue vermelho no trono em que se sentaria, ficou tão
contrariado, que saiu imediatamente do recinto, sentindo-se muito
ofendido.
Oxum, envergonhada com o acontecido, não conseguia entender
porque havia ficado presa em sua própria cadeira, uma vez que ela mesma
tinha cuidado de todos os preparativos.
Escondendo-se de todos, foi
consultar o oráculo de Ifá para obter um conselho. O jogo, então, lhe
revelou que Oxorongá havia colocado feitiço em seu assento, por não ter
sido convidada.
Exú, a pedido de Oxum, foi em busca do grande pai,
para relatar-lhe o ocorrido.Oxalá retornou ao palácio, onde a grande mãe
das águas estava sentada de cabeça baixa, muito constrangida. Quando
ela o viu, começou a abanar seu abebe, transformando o sangue de suas
roupas em penas vermelhas, que, ao voar, caíram sobre a cabeça de todos
os que ali estavam, inclusive a de Oxalá. Em reconhecimento ao esforço
que ela empreendeu para homenageá-lo, ele aceitou aquela pena vermelha
(ekodide), prostrando-se à sua frente, em sinal de agradecimento.
A partir de então, essa pena foi introduzida nos rituais de feitura do Candomblé.